Quais são as possibilidades de paz na Ucrânia?
Uma guerra permanente levará a uma perda desnecessária de vidas na Ucrânia e a uma crise econômica permanente na Europa
Originalmente publicado por Globetrotter em 05.03.25
Tudo isso é um fiasco. O drama teatral no Salão Oval da Casa Branca desencadeou uma série de respostas previsíveis ao redor do mundo. Indignação com o presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, por sua grosseria, e ridicularização do presidente ucraniano, Volodymyr Zelensky, foram algumas das reações. Depois, o fracasso do presidente francês, Emmanuel Macron, em criar um acordo europeu com Keir Starmer, do Reino Unido, e Zelensky revelou os becos sem saída absolutos que este exausto conflito na Ucrânia enfrenta. A pergunta que essas discussões provocam é simples: há uma saída para esta guerra?
Guerra permanente
Se os objetivos de guerra de Zelensky e seus parceiros europeus são de enfraquecer a Rússia ou derrubar o governo de Vladimir Putin, então essa guerra pode durar para sempre ou acelerar para um cenário nuclear perigoso. Pesquisas de opinião na Rússia mostram que a aprovação de Putin está agora em 87%. Mesmo com um grande grau de ceticismo, essa taxa é muito maior do que a de Macron na França. Com a economia russa resiliente durante esta guerra, é improvável que ela seja ainda mais enfraquecida com a continuação das hostilidades. O que as evidências mostram, no entanto, é que a economia europeia está sofrendo com uma inflação de guerra que ainda não foi reduzida.Se essa guerra continuar, Macron afirmou que os estados europeus terão que aumentar seus gastos militares para 3% ou 3,5% do PIB. Isso prejudicaria ainda mais as condições de vida da maioria dos europeus. Os jovens da classe trabalhadora europeia estariam dispostos a se dirigir à perigosa linha de frente na Ucrânia para lutar por um objetivo de guerra (enfraquecer a Rússia) que é impossível? Isso é improvável. (Há uma crueldade adicional no fato de que a classe média ucraniana foge para a Europa Ocidental, enquanto os trabalhadores ocidentais são chamados a defender aquele país em seu lugar).
Uma guerra permanente levará a uma perda desnecessária de vidas na Ucrânia e a uma crise econômica permanente na Europa. Além disso, é improvável que os Estados Unidos apoiem financeiramente e militarmente essa guerra indefinidamente, o que resultaria no colapso de qualquer compromisso europeu de longo prazo com a Ucrânia.
A solução coreana
Se nem a Ucrânia nem a Rússia estiverem dispostas a avançar para um cessar-fogo e, em seguida, para um acordo negociado (que incluiria garantias de segurança para todos os lados), então existe a possibilidade de que a atual linha de frente, que se estende do norte ao leste da Ucrânia, se torne uma Zona Desmilitarizada (DMZ) permanente. Isso significaria que a Ucrânia permaneceria dividida indefinidamente, com um imenso desperdício de riqueza social para manter uma linha de frente perpétua. Esse é o cenário mais provável, embora possa não ser agradável para os europeus ter uma "Coreia" dentro do seu próprio continente.O exército sul-coreano mantém 600.000 soldados ao longo do Paralelo 38, ao lado de quase 30.000 soldados dos EUA. Situação semelhante ocorre no norte. Bilhões de dólares são gastos anualmente em vigilância e logística para mais de 900 milhas quadradas de território que não estão disponíveis para uso econômico. A Europa teria que financiar essa "solução coreana" para a Ucrânia para sempre (assim como os Estados Unidos fornecem garantias e fundos para a Coreia do Sul, e a China faz o mesmo para a Coreia do Norte).
Um consórcio de segurança
O Processo de Helsinque, que surgiu para trazer os EUA e a URSS para negociações em 1975 e que formou a Organização para Segurança e Cooperação na Europa (OSCE), praticamente não teve nenhum papel na busca da paz na guerra da Ucrânia.Os únicos interlocutores autorizados a falar sobre a guerra na Ucrânia em nome de Zelenskyy têm sido os Estados Unidos, os líderes da Europa Ocidental, os líderes da União Europeia (UE) e a Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN). Líderes da Europa Oriental – exceto aqueles já integrados à OTAN e à UE – foram silenciados ou informados de que suas opiniões não importam. No entanto, são esses países do Leste Europeu que compartilham com a Ucrânia o fato de terem fronteira com a Rússia, e são esses países que mais precisam formar um consórcio de segurança que inclua a Rússia e forneça garantias recíprocas.
Os países que compartilham uma fronteira com o oeste da Rússia são, de norte a sul: Noruega, Finlândia, Estônia, Letônia, Bielorrússia, Ucrânia, Geórgia e Azerbaijão. (Lituânia e Polônia compartilham uma fronteira com o Oblast de Kaliningrado, um enclave russo no Mar Báltico). Três desses países (Finlândia, Estônia e Letônia) são membros da OTAN e da UE, enquanto um deles (Noruega) é membro da OTAN, mas não da UE.
Seria possível para esses oito países convocarem uma conferência com a Rússia sobre as questões mais amplas de segurança, em vez de se concentrarem apenas no conflito ucraniano? O fato de que três desses países fronteiriços já são membros da OTAN (um deles, a Noruega, foi membro fundador da aliança em 1949) sugere que os problemas da Ucrânia não derivam apenas da questão da adesão à OTAN. Em vez disso, decorrem da ansiedade sobre uma fronteira desenhada às pressas quando a União Soviética colapsou em 1991. Isso impacta Estônia, Letônia, Bielorrússia, Ucrânia, Geórgia e Azerbaijão, mas não Noruega e Finlândia, que nunca fizeram parte da URSS.
No início dos anos 1980, o ex-primeiro-ministro sueco Olof Palme presidiu a Comissão Independente sobre Questões de Desarmamento e Segurança, cujo relatório de 1982, Common Security: A Programme for Disarmament, argumentava que “A tarefa da diplomacia é limitar, dividir e subdividir conflitos, não generalizá-los e agregá-los.” Em outras palavras, nem todos os conflitos podem ser resolvidos ao mesmo tempo. Um cessar-fogo, por si só, já é um avanço. As questões precisam ser separadas, resolvendo-se primeiro as mais fáceis para construir confiança. Agrupar todas as questões em um único problema torna um conflito insolúvel.
Os países vizinhos – incluindo aqueles que fazem fronteira com o sul e o leste da Rússia – devem encontrar uma maneira de construir confiança. Eles não podem simplesmente se deslocar geograficamente para outro lugar. A Ucrânia não pode ser realocada para a França; ela permanecerá ao lado da Rússia.
Começar pelo princípio de que “não se pode confiar no vizinho” é a pior maneira de construir confiança entre povos vizinhos. Nem a UE nem a OTAN (sem o apoio militar total dos EUA) podem subjugar a Rússia e forçá-la a se curvar diante da Ucrânia. Um ministro do gabinete britânico afirmou no ano ado que o seu país só aria seis meses de guerra em larga escala contra a Rússia. Enquanto isso, um relatório do Instituto Kiel para a Economia Mundial sugere que a Alemanha está gastando dinheiro comprando armas, mas não tem um exército capaz de se defender, muito menos de vencer uma guerra ofensiva contra a Rússia. A Europa, sem os Estados Unidos, é uma sombra.
Se a construção de um consórcio de segurança puder reduzir tensões e levar à paz na Ucrânia, isso será infinitamente melhor do que deixar uma cicatriz permanente nesta parte do continente europeu.
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